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sábado, 27 de junho de 2009

Dica de Leitura: Carlos Heitor Cony...

Folha On Line 18/04/2006

O tempo do tempo
O herói da Maratona precisou correr 42 quilômetros para transmitir a notícia da vitória numa guerra. Morreu logo após ter cumprido a tarefa. A descoberta (ou o achamento) do Brasil levou mais de dois meses para chegar ao conhecimento do rei Manuel, dito o Venturoso. Hoje, com a internet em funcionamento, seria Venturoso antes do tempo, ficaria sabendo da façanha de Cabral na hora.
A instantaneidade da notícia é uma das conquistas mais fantásticas da humanidade. Cem anos após a proclamação da nossa República, em 1889, havia brasileiro lá pelo setentrião acreditando que o Brasil ainda era governado por um Dom Pedro qualquer, provavelmente Dom Pedro 3º ou 4º.
Consta que no Japão, apesar de seu avançado estágio tecnológico, ainda há soldado do Mikado escondido nas matas pensando que a 2ª Guerra Mundial não acabou.Outro dia, a bordo de um avião em vôo doméstico, o piloto informou, com voz aveludada e calma, que o tempo estava ótimo em toda a rota. Nem havia comunicado integralmente a boa notícia, o aparelho começou a sacudir como se estivesse com mal de Parkinson.Quando passou a turbulência --uma das maiores que já atravessei-- o piloto explicou que os computadores estavam certos nas duas ocasiões, a do tempo bom e a do tempo ruim. Apenas --disse ele-- o tempo fora mais rápido, não dando tempo para que a rede eletrônica de bordo e das estações meteorológicas no caminho pudessem fazer a correção a tempo.
Repeti a palavra "tempo" várias vezes porque acredito que seja o único fato e fator inamovíveis da nossa vida. Não precisa de notícia para existir. Não precisa de tempo para ser tempo.
Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Alugando a paciência de VCS...

O lugar da ética no trabalho do (a) professor (a)

Muitas são as reflexões acerca do papel social do professor(a) na modernidade. Em número crescente surgem os artigos; os ensaios e as teses, que buscam indicar os caminhos necessários ao exercício desta profissão. Assim, se escreve sobre como é ou deve ser a relação do professor com os pares e com os seus alunos; a respeito das relações didáticas e inerentes à socialização do conhecimento; das lutas à democratização do ensino; da violência e da crise da instituição escolar; dos modos e das formas da gestão em políticas públicas na educação. Por outro lado, ao mergulhar na discussão da prática docente no cotidiano institucional poderíamos indagar: como os professores se posicionam diante das noções de bem e mal; do justo ou injusto; do que é ou não correto? Ou, em outros termos, como os aspectos de uma moralidade profissional podem constituir-se em posturas éticas no exercício da profissão? Assim, a presente reflexão busca formular algumas questões sobre o lugar da ética no trabalho do professor(a).
Definições sintéticas indicam o início da discussão do tema em questão e, nesse aspecto, a moral pode ser um ponto de partida desejável se entendida como um corpo de regras e normas, socialmente aceitas como as mais adequadas para a vida de uma coletividade. Sejam as normas e regras sancionadas juridicamente e na forma de leis ou, os costumes e hábitos sociais que se impõem ao grupo ao longo de sua história. A moral, ao constituir-se como um fenômeno que regula a vida social e que julga o agir considerado correto ou errado, coloca a questão da tensão/conflito que se estabelece entre o sujeito e a esfera social. Nesse ponto da discussão, podemos afirmar que o indivíduo define-se pela sua capacidade de pensar; julgar e querer, levando-o a posicionar-se frente ao mundo e frente aos outros: compreendendo; escolhendo e desejando. Por outro lado, essa tríade afirma-se na sua relação com uma outra: de contexto; de organização do trabalho; de história, isto é, emerge no campo das necessidades; da produção e reprodução da materialidade humana e, ainda, constitui-se como ações no mundo. Tais ordens estão em tensão porque nem sempre o compreender; o escolher e o desejar coincidem com as delimitações inerentes ao contexto; à organização do trabalho e à história. Trata-se do velho conflito indivíduo – sociedade e em meio a tal, os prepostos da moral modelam as escolhas individuais frente às necessidades sociais.
Na modernidade a moral não é espelho do contexto; trabalho e história de uma coletividade, mas de uma classe social: a burguesia. Nem de toda ela, mas da fração de classe que se impõem, em determinado momento, como hegemônica. Desse modo, aquilo que é tido como socialmente justo ou injusto; o bem e o mal; o certo e o errado; não corresponde à compreensão; escolha e desejo de cada indivíduo e nem do conjunto dos participantes da vida social. Ao contrário, reflete o contexto; a organização do trabalho e a história da fração dominante e que apresenta as suas particularidades como se fossem as determinações da totalidade social. Tais particularidades de classe também não coincidem de maneira unívoca às concepções da classe que as produziram: trata-se, a moral, de uma concepção invertida do real em que, num mundo povoado de mercadorias, cria a ilusão da qual as coisas/objetos, e não o ser humano, é que determinam as regras da vida social. E assim, seguindo as pistas lançadas por Marx, podemos afirmar que a moral, sob a sociedade burguesa, assume a forma de ideologia. E qual seria o seu cerne? Novamente podemos recorrer a Marx e buscar a explicitação da moral no contexto; trabalho e história da sociedade burguesa e sintetizada em uma máxima:
Cada homem especula sobre a maneira de como criar no outro uma nova necessidade para o forçar a novo sacrifício, o colocar em nova dependência, para o atrair a uma nova espécie de prazer e, dessa forma, à destruição (...) quanto menos cada um comer, beber, comprar livros, for ao teatro, ao bar, quanto menos cada um pensar, amar, teorizar, cantar, pintar, poetar etc., mais economizará, maior será sua riqueza, que nem a traça nem a ferrugem corroerão, o seu capital. Quanto menos cada um for, quanto menos cada um expressar a sua vida, mais terá, maior será a sua vida alienada e maior será a poupança da sua vida alienada (Marx, 2002: 149 e 152).
Em outros termos, a moral como ideologia sedimenta uma práxis que transformou a realização pessoal, promovida entre indivíduos e destes com a coletividade, em mero prazer obtido pela posse do objeto. No lugar de fazer-me indivíduo pela minha interação com os outros, me torno uma particularidade fechada em mim mesmo, pela coleção de mercadorias que possuo e, para tal, vale tudo: quanto menos cada um pensar, amar, teorizar, cantar, pintar, poetar etc., mais economizará [para comprar mercadorias], maior será sua riqueza [de objetos inúteis], que nem a traça nem a ferrugem corroerão ...
Sob o signo desta moral, tornada historicamente ideologia, é que outras pequenas morais, não de classe e sim de grupo, afirmam-se. Entre elas, aquela correspondente ao exercício da profissão docente, que se constitui por códigos do que é certo ou errado; justo ou injusto; do bem e do mal no exercício da profissão. É óbvio que essa moralidade profissional está imbricada com a ideologia: sempre vemos no cotidiano escolar a defesa que muitos professores fazem a respeito do dever de seus alunos em prepararem-se para o mercado, no lugar da crítica; professores portando e adorando griffes – verdadeiras ou falsas, em vez do questionarem-se a respeito; defendendo, com pouca consciência, que a posse de objetos é mais importante que as interações sociais. Entre professores, o que é certo ou errado; bem ou mal; justo ou injusto, acaba determinado pela grande moral ou ideologia. Porém e contraditoriamente, a moralidade do professor pode adquirir formas de maior independência frente à ideologia, pois aquela pequena moral profissional, ao originar-se da prática cotidiana do experimentar a profissão, permite concordar ou discordar com os prepostos da grande moral ou ideologia.
Um exemplo tipifica esta última questão. Imaginemos um(a) professor(a) do ensino público, que foi designado a lecionar numa escola situada em região urbana com altos índices de violência. Ao vivenciar as primeiras semanas neste contexto, tal professor(a) percebe as dificuldades na realização do seu trabalho. O que seria correto: continuar lecionando em tal realidade, ou buscar um contexto menos violento para exercer a sua profissão? Caso a escolha seja a de ir ao encontro de uma nova escola em região menos violenta, o professor(a) em questão faria uma escolha moral, pois adotaria a regra socialmente tida como correta: afastar-se do perigo e proteger-se; é bom lembrar que o individualismo faz parte da grande moral moderna. Porém, a escolha poderia ser outra: permanecer na mesma escola, sob todos os riscos e, ainda, engajar-se em movimentos pela paz. Essa outra opção se daria por meio de uma escolha ética. E qual a diferença em ambas? Na primeira o agir profissional está vinculado a uma escolha comum, pois admitir que cada um deve pensar em si mesmo é algo valorizado. Já, na segunda, o agir se aproximaria de uma escolha capaz de interrogar-se e questionadora da validade de um aspecto moral. Neste ponto está o significado da postura ética na profissão: o interrogar-se a respeito da prática profissional na perspectiva da crítica da pequena moral.
Deste pequeno exemplo, ainda poderíamos pensar outros, aprendemos que todos os professores são pessoas morais, o que não significa que tenham postura ética em todo momento. A ética situa-se acima da moralidade porque é capaz de questiona-la. Nesse sentido, é esclarecedora a posição de Nascimento quando afirma: a questão ética não se restringe ao plano da aceitação das normas socialmente estabelecidas nem se reduz ao problema da criação dos valores por uma liberdade solitária. Nasce na existência concreta de cada um, da consciência dos valores envolvidos no reconhecimento da inalienável dignidade da pessoa e do sentido da responsabilidade pessoal diante do outro, cujo rosto é um apelo constante a ser respeitado e promovido (1984:16). Daí a importância em qualificar o trabalho do professor(a) como uma atividade que ultrapasse a dimensão moral na direção da postura ética, pois apenas esta última é capaz de estabelecer os projetos sociais geradores da nova tríade – contexto; trabalho e história. Em suma, a ética permite a crítica à pequena moral e pela crítica é possível questionarmos a ideologia, lançando-nos em diferentes alternativas sociais.

Autor desconhecido.

Continuando a discussão sobre Ética...

Segue abaixo a transcrição de uma palestra proferida a profissionais da área de Sérviço soc ial Sobre o Tema ÉTICA. Considerando que os valores éticos, no meu entender, são universais, acredito que esta é uma bõa oportundade para extendermos esse debate ao nosso meio, de professores e alunos.

Bõa Leitura!!!

Textos para reflexão é uma publicação on-line do Departamento de Serviço Social e Colegiado de Curso de Serviço Social da Universidade Estadual de Ponta Grossa, sem periodicidade regular, destinados a socializar discussões e reflexões realizadas em salas de aula, palestras, cursos, projetos de pesquisa e extensão entre outros espaços. Os textos são divulgados a pedido do Corpo Docente do Curso de Serviço Social. Os textos, incluindo opiniões e conceitos emitidos, são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

É livre a reprodução não comercial, desde que citada a fonte.

Coordenação “Textos para reflexão”

Gisele Alves de Sá Quimelli

Lenir Aparecida Mainardes da Silva

Édina Schimanski

ÉTICA PROFISSIONAL*

Edite Jendreick Franke1 (Palestra proferida pela Professora Mestre Edite Jendreieck Franke na III Jornada de Estágio do Curso de Serviço Social da UEPG em 25/09/2007).

Bom dia a todos e a todas, minhas amigas professoras do Curso de Serviço Social, acadêmicos aqui presentes.

Quero agradecer ao Departamento de Serviço Social a oportunidade de aqui estar para, com vocês, refletir um pouco sobre ética profissional. No momento em que se diz que o Brasil está passando por uma crise ética, oportuno se faz falar sobre a Ética Profissional.

Necessário se faz lembrar que, quem não tem ética pessoal, não terá ética profissional.

A palavra Ética, do grego ethos, designa . . .

Os costumes;

A condução da vida;

As regras de comportamento.

A Ética é o estudo da moralidade do agir humano;

É o estudo da bondade ou da maldade dos atos humanos,

A retidão dos atos humanos frente à ordem moral.

É justificada pela Moral enquanto esta estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir o bem viver, um agir segundo o bem, remetendo estas regras ao agir humano, aos comportamentos cotidianos, às escolhas existenciais. . .

. . .a Ética se coloca como um questionamento sobre o agir, uma reflexão sobre o que é preciso fazer, uma procura pelo que é bom ou justo.

A Ética não estabelece regras, mas propõe uma reflexão sobre a ação humana, sobre sua retidão frente à ordem moral.

A Ética espontaneamente gera:

1- Questionamentos: a ética nos leva a refletir sobre as normas ou regras de comportamento, nos leva a analisar princípios, valores que fundamentam nossa obrigação na sociedade.

2- Sistematização da reflexão: encontrada em teorias ou escolas que tratam da moral e da ética, ou o conjunto de normas de grupos específicos, como é o caso dos códigos de ética profissional.

3- Prática concreta: ou a realização de valores que exige o processo de deliberação, a decisão, a atitude subjacente e a ação propriamente dita. Toda herança da reflexão sobre a Ética e a Moral se apresenta subjacente à Ética Profissional. Isto é, a Ética Profissional só se efetivará se houver a Ética Pessoal.

Importante identificarmos, refletirmos aqui: quem é o Sujeito Ético?

Sujeito Ético é todo ser humano que se depara com a necessidade de decidir, pois onde há decisões a serem tomadas; reflexões a serem feitas; e liberdades a serem alcançadas. . . Há a Ética.

A Ética não existe sem a responsabilidade.

Uma Ética de Responsabilidade é a do sujeito livre, autônomo, que reflete, dotado de prudência, coragem e convicção. A responsabilidade dá cada vez mais lugar à interrogação e à discussão democrática.

Assim, cada vez mais a Ética recorre à prudência, que é vigilância e previsão, e à solidariedade. A Ética profissional pode ser definida como:

A reflexão sobre as exigências do profissional em sua relação -

com o cliente/usuário;

com o público;

com seus colegas;

e com sua corporação,

com os demais profissionais.(Durand, p 85)

Estas exigências remetem ao conjunto de direitos e de obrigações expressos no Código de Ética da profissão.

A reflexão sobre as ações realizadas no exercício de uma profissão,

. . . no que consistem,. . .

. . . a quem se destinam,. . .

. . . para que se destinam. . .

deve iniciar antes da prática profissional .

A fase da escolha profissional, ainda durante a adolescência muitas vezes, já deve ser permeada por esta reflexão.

A escolha por uma profissão é optativa, mas ao escolhê-la, o conjunto de deveres Profissionais passa a ser obrigatório. Geralmente, quando se é jovem, escolhe-se a carreira sem conhecer o conjunto de deveres que está prestes a assumir ao tornar-se parte daquela categoria que escolheu.

Toda a fase de formação profissional. . .o aprendizado das competências e habilidades referentes à prática específica numa determinada área, deve incluir a reflexão, desde antes do início dos estágios práticos.

Ao completar a formação em nível superior, a pessoa faz um juramento, que significa sua adesão e comprometimento com a categoria profissional onde formalmente ingressa.

Isto caracteriza o aspecto moral da chamada Ética Profissional, Seja, esta adesão voluntária a um conjunto de regras estabelecidas como sendo as mais adequadas para o seu exercício.

No período de formação e mesmo depois no decorrer da prática, o profissional deve estar sempre se perguntando:

1- Que deveres assumi? O que a entidade, a chefia, e o usuário esperam de mim?

Estes deveres são compatíveis com a profissão?

Ou é a chamada exigência generalista do mercado?

2- Estou assumindo uma função institucional ou a profissão mesma?

3- Como estou conduzindo os deveres assumidos? Como estou cumprindo minhas responsabilidades? Estou me conduzindo nos valores previstos pelo Código de Ética da Profissão?

4- O que devo fazer e como fazer? Planejo, organizo, sistematizo, avalio minhas ações?

Que resultados produzo? Em benefício de quem?

5- E tão importante quanto os aspectos acima: Estou sendo bom profissional? Competente, coerente? Estou agindo adequadamente nas relações pessoais e profissionais?

Isto inclui:

- respeitar e exigir respeito.

- atitudes de generosidade e cooperação, trabalho em equipe.

- uma postura pró-ativa (que é compromisso/ é contribuir para o engrandecimento do trabalho).

- estar preocupado, com as PESSOAS, que é ser coerente com os deveres profissionais.

Acredito na profissão a qual defendi durante toda minha vida de prática profissional e como docente. Sempre busquei apresentar o quanto é importante e bom SER PROFESSOR, como se faz necessário o esmerado preparo profissional e o compromisso com a realidade alvo de nossa intervenção. O trabalho profissional não permite acomodação e o profissional comprometido não se acomoda. Só se acomoda e arrisca virar fóssil aquele que não tem amor por sí mesmo e pelo próximo (alteração do responsável por este blog).

O Serviço Social é uma profissão que tem sua legitimidade regulamentada em Lei e fundamentada em seu Código de Ética, e este defende a equidade e a justiça social. O processo de renovação pelo qual o Serviço Social tem passado no transcorrer de sua história vem compromissado com esses valores e princípios que são defendidos por seus profissionais na conquista de direitos sociais, na defesa dos direitos já alcançados e na ampliação destes. Apegados a estes valores não poderemos deixar de ser Éticos. Ser Assistente Social é fazer Serviço Social.

A identidade profissional é construída pelos grupos profissionais de que fazemos parte. Como o grupo existe? Passa a existir através das relações que estabelecem seus membros entre sí e com o meio em que vivem, isto é, pela sua prática, seu agir, seu trabalhar, fazer, pensar, sentir. . .

O indivíduo (assistente social) vai sendo representado previamente na graduação e vai assimilando em um processo interno a representação desta identidade.

Esta identidade pressupõe o fazer, as práticas de serviço social que realiza, mas é a aceitação da identidade que força comportamentos, ações compatíveis com a profissão. É a aceitação que leva o assumir a postura ética exigida pela profissão.

Por isto a identidade precisa ser continuamente reposta, que significa “agir como”. Comparecer perante o outro como portador de um papel, mas como representante de sí e de um grupo profissional.

Ser assistente social ético exige: Competência técnica, aprimoramento constante, respeito às pessoas, confidencialidade, privacidade, tolerância, flexibilidade, fidelidade, envolvimento, afetividade, correção de conduta, boas maneiras, relações genuínas com as pessoas, responsabilidade, corresponder à confiança que lhe é depositada... pois o comportamento ético de um profissional reflete em todos os demais da profissão. Vale lembrar que comportamento eticamente adequado e sucesso continuado são indissociáveis! Empregabilidade é sinônimo de bom profissional. E só pode ser ético profissionalmente aquele que o é pessoalmente.

Lembro aqui a passagem de Lucas, que em seu Capítulo 16 traz a palavra de

Jesus: “ Quem é fiel nas pequenas coisas também é fiel nas grandes, e quem é injusto

nas pequenas, também é injusto nas grandes”. (Lucas 16, 10).

Obrigada, e vamos em frente pela Ética agora e sempre!

Referências:

GLOCK, Rosana Soibelmann e GOLDIM, José Roberto. Ética Profissional é compromisso social, texto trabalhado na Disciplina Ética Profissional, Professor Carlos Eduardo Coradassi, Curso de Medicina Veterinária, CESCAGE.

DURAND, Guy. Introdução Geral à Bioética, Edições Loyola, São Paulo, 2003.

CIAMPA, Antonio da Costa. IDENTIDADE, in Lane, org., Psicologia Social – o homem em movimento, Brasiliense, São Paulo, 10º Ed., 1992.

GENTILLI, Raquel de Matos Lopes. Representações e Práticas: identidade e processo de trabalho no serviço social, São Paulo, Veras, 1998.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Texto de Umberto eco (Para quem gosta de ler sobre moral...).

Quando o outro entra em cena
Umberto Eco
Extraído de 'Cinco Escritos Morais'
(O presente texto é uma resposta de Umberto Eco ao cardeal Carlo Maria Martini - arcebispo de Milão e um dos prováveis sucessores de João Paulo II - no curso de uma troca de cartas organizada e publicada pela revista Liberal. O texto responde à pergunta feita a Eco pelo cardeal Martini: "Em que o senhor baseia a certeza e a imperatividade de seu agir moral sem fazer apelo, para fundar a universalidade de uma ética, a princípios metafísicos ou, de qualquer forma, a valores transcendentes, e sequer a imperativos categóricos universalmente válidos?")
Caro Carlo Maria Martini, Sua carta tirou-me de um grave embaraço, para colocar-me em outro de igual gravidade. Até agora tenho sido eu (e não por decisão minha) a abrir a discussão, e quem fala primeiro fatalmente interroga, esperando que o outro responda. Daí meu embaraço ao sentir-me inquisitório. E muito apreciei a decisão e humildade com que o senhor, por três vezes, desafiou a lenda de que os jesuítas responderiam sempre a uma pergunta com outra pergunta. Agora, porém, sinto-me embaraçado para responder sua pergunta, pois minha resposta seria significativa se eu tivesse tido uma educação leiga e, ao contrário, tive uma forte influencia católica até (para assinalar o momento de uma ruptura) os vinte e dois anos. A perspectiva laica não foi para mim uma herança absorvida passivamente, mas o fruto, muito sofrido, de uma longa e lenta maturação, e não estou certo de que algumas de minhas convicções morais não dependem ainda de uma influência religiosa que marcou minhas origens. Hoje, já em idade avançada, vi (em uma universidade católica estrangeira que tem em seus quadros professores de formação leiga e deles exige, no máximo, manifestações de respeito formal no curso dos rituais religiosos-acadêmicos) alguns de meus colegas chegarem aos sacramentos sem que acreditassem na Presença Real e, portanto, sem que tivessem sequer se confessado. Com um frêmito, depois de tantos anos, adverti ainda o horror do sacrilégio. Todavia, creio poder dizer em que fundamentos se baseia, hoje, minha "religiosidade laica" - porque creio firmemente que existem formas de religiosidade, e logo sentido do Sagrado, do Limite, da interrogação e da espera, da comunhão com algo que nos supera, mesmo na ausência da fé em uma divindade pessoal e providente. Mas isso, posso percebê-lo em sua carta, o senhor também sabe. O que o senhor tem se perguntado é o que há de vinculante, arrebatador e irrenunciável nestas formas de ética.
Gostaria de tomar as coisas à distância. Certos problemas éticos tornam-se mais claros para mim ao refletir sobre alguns problemas semânticos - e não se preocupe porque alguns dizem que falamos difícil: eu poderia ter sido encorajado a pensar fácil demais pela "revelação" do massa média, previsível por definição. Que aprendam a pensar difícil, pois nem o mistério nem a evidência são fáceis.
Meu problema era se existem "universais semânticos", ou seja, noções elementares comuns a toda a espécie humana que podem ser expressas por todas as línguas. Problema não tão óbvio, no momento em que sabemos que muitas culturas não reconhecem noções que para nós parecem evidentes: por exemplo, a de substância a que pertencem certas propriedades (como quando dizemos "a maçã é vermelha") ou a de identidade (a=a). Estou convencido de que certamente existem noções comuns a todas as culturas, e que todas elas referem-se às posições de nosso corpo no espaço. Somos animais de postura ereta, por isso é cansativo permanecer muito tempo de cabeça para baixo e, portanto, temos uma noção comum de alto e baixo, tendendo a privilegiar o primeiro sobre o segundo. Igualmente temos noções de direita e esquerda, do estar parado e do caminhar, do estar em pé ou deitado, do arrastar-se e do saltar, da vigília e do sono. Como todos temos membros, sabemos o que significa bater em uma matéria resistente, penetrar em uma substância mole ou líquida, esmagar, tamborilar, amassar, chutar, talvez até dançar. A lista poderia continuar longamente e compreender o ver, o ouvir, comer ou beber, ingurgitar ou expelir. E certamente todo homem tem noção de que coisa significa perceber, recordar, sentir desejo, medo, tristeza ou alívio, prazer ou dor, e emitir sonos que exprimam estes sentimentos. Portanto (e já entramos na esfera do direito), temos concepções universais acerca do constrangimento: não se deseja que alguém nos impeça de falar, ver, ouvir, dormir, ingurgitar ou expelir, ir aonde quisermos; sofremos se alguém nos amarra ou mantém-nos segregados, nos bate, fere ou mata, nos sujeita a torturas físicas ou psíquicas que diminuam ou anulem nossa capacidade de pensar. Notemos que até agora coloquei em cena apenas uma espécie de Adão bestial e solitário, que ainda não sabe o que seja a relação sexual, o prazer do diálogo, o amor pelos filhos, a dor da perda de uma pessoa amada; mas já nessa fase, pelo menos para nós (se não para ele ou ela), esta semântica já tornou-se a base de uma ética: devemos, antes de tudo, respeitar o direito da corporalidade do outro, entre os quais o direito de falar e pensar. Se nossos semelhantes tivessem respeitado esses "direitos do corpo" não teríamos tido o massacre dos Inocentes, os cristãos no circo, a noite de São Bartolomeu, a fogueira para os hereges, os campos de extermínio, a censura, as crianças nas minas, os estupros na Bósnia.
Mas como é que, mesmo elaborando de imediato o seu repertório instintivo de noções universais, o/a besta - toda estupor e ferocidade - que coloquei em cena poderia chegar a compreender que deseja fazer certas coisas e que não deseja que lhe façam outras, e também que não deveria fazer aos outros o que não quer que façam a si mesmo? Porque, felizmente, o Éden populou-se rapidamente. A dimensão ética começa quando entra em cena o outro. Toda lei, moral ou jurídica, regula ações interpessoais, inclusive aquelas com um Outro que a impõe.
Também o Senhor atribui ao leigo virtuoso a convicção de que o outro está em nós. Não se trata, porém, de uma vaga propensão sentimental, mas de uma condição "fundadora". Assim como ensinam as mais laicas entre as ciências, é o outro, é o seu olhar, que nos define e nos forma. Nós (assim como não conseguimos viver sem comer ou sem dormir) não conseguimos compreender quem somos sem o olhar e a resposta do outro. Mesmo quem mata, estupra, rouba, espanca, o faz em momentos excepcionais, mas pelo resto da vida lá está a mendigar aprovação, amor, respeito, elogios a seus semelhantes. E mesmo àqueles a quem humilha ele pede o reconhecimento do medo e da submissão. Na falta desse reconhecimento, o recém-nascido abandonado na floresta não se humaniza (ou, como Tarzan, busca o outro a qualquer custo no rosto de uma macaca), e poderíamos morrer ou enlouquecer se vivêssemos em uma comunidade na qual, sistematicamente, todos tivessem decidido não nos olhar jamais ou comportar-se como se não existíssemos.
Como então houve ou há culturas que aprovam o massacre, o canibalismo, a humilhação do corpo de outrem? Simplesmente porque essas culturas restringem o conceito de "outros" à comunidade tribal (ou à etnia) e consideram os "bárbaros" como seres desumanos; e sequer os cruzados sentiam os infiéis como um próximo que devia ser tão amado assim. É que o reconhecimento do papel dos outros, a necessidade de respeitar neles aquelas exigências que para nós são inabdicáveis, é produto de um crescimento milenar. Até mesmo o mandamento cristão do amor foi enunciado e aceito (com dificuldade) apenas quando os tempos estavam maduros para tal. Mas o Senhor pergunta: essa consciência da importância do outro é suficiente para fornecer-me uma base absoluta, um fundamento imutável para um comportamento ético? Bastaria que eu respondesse que também aqueles que o Senhor define como "fundamentos absolutos" não impedem que muitos fiéis pequem sabendo que pecam, e o discurso acabaria aqui: a tentação do mal também está presente em quem tem uma noção fundamentada e revelada do bem. Mas gostaria de contar-lhe duas anedotas que muito me fizeram pensar.
Uma refere-se a um escritor - que se proclama católico, embora sui generis - do qual não cito o nome apenas porque disse o que vou contar em uma conversa particular e eu não sou nenhum sicofanta. Foi no tempo de João XXIII e meu velho amigo, celebrando entusiasticamente suas virtudes, disse (com evidente intenção paradoxal): "João XXIII deve ser ateu. Só quem não acredita em Deus pode querer tão bem a seus semelhantes!" Como todos os paradoxos, este também continha um grão de verdade: sem pensar no ateu (figura cuja psicologia me foge, porque kantianamente não vejo como se possa não acreditar em Deus, e considerar que não se pode comprovar Sua existência e acreditar firmemente na inexistência de Deus, pensando poder prová-lo), parece-me evidente que uma pessoa que nunca teve a experiência da transcendência, ou perdeu-a, pode dar um sentido à própria vida e à própria morte, pode sentir-se confortado só com o amor pelos outros, com a tentativa de garantir a alguém uma vida vivível, mesmo depois que ele mesmo já tenha desaparecido. É verdade que há quem não creia e não se preocupe em dar um sentido à própria morte, mas há também quem afirme crer e, no entanto, seja capaz de arrancar o coração de uma criança para garantir a própria vida. A força de uma ética julga-se através do comportamento do santos, não dos insipientes cujus deus venter est.
E passo à segunda anedota. Eu era ainda um jovem católico de dezesseis anos e aconteceu de empenhar-me em um duelo verbal com um conhecido mais velho que eu e tido como "comunista", no sentido que tinha esse termo nos terríveis anos 50. E como me provocasse, coloquei-lhe a seguinte pergunta decisiva: como podia ele, um incrédulo, dar um sentido àquela coisa tão insensata que seria a própria morte? E ele respondeu-me: "Pedindo antes de morrer um funeral civil. Assim, já não estarei presente, mas terei deixado aos outros um exemplo." Creio que também o senhor pode admirar a fé profunda na continuidade da vida, o sentido absoluto do dever que animava aquela resposta. E foi este sentido que levou muitos incrédulos a morrer sob tortura para não trair os amigos, outros a infectarem-se com a peste por cuidar dos infectados. Essa é, até hoje, a única coisa que leva um filósofo a filosofar, um escritor a escrever: deixar uma mensagem na garrafa porque, de alguma maneira, aqueles que virão poderão acreditar ou achar belo aquilo em que ele acreditou ou que achou belo.
Este sentimento tão forte justificaria, realmente, uma ética tão determinada e inflexível, tão solidamente fundamentada quanto a dos que crêem na moral revelada, na sobrevivência da alma, nos prêmios e nos castigos? Tentei basear os princípios de uma ética laica em um fato natural (e, como tal, também para o Senhor, resultado de um projeto divino) como a nossa corporalidade e a idéia de que só sabemos instintivamente que temos uma alma (ou algo que exerce tal função) em virtude da presença do outro. Surge daí que aquela que defini como "ética laica" é, no fundo, uma ética natural, que também não é desconhecida para os que crêem. O instinto natural, levado à devida maturação e autoconsciência, não é um fundamento que dê garantias suficientes? É verdade que podemos pensar que não é estímulo suficiente para a virtude: "assim", pode dizer que não crê, "ninguém saberá do mal que secretamente estou fazendo". Mas pense bem, quem não crê considera que ninguém o observa lá do alto e sabe, portanto, que - exatamente por isso - também não há Alguém que o possa perdoar. Se sabe ter feito o mal, sua solidão não conhecerá limites e sua morte será desesperada. Tentará antes, mais que o crente, a purificação da confissão pública, pedirá perdão aos outros. Isto ele o sabe no íntimo de suas fibras e, portanto, terá que perdoar antecipadamente os outros. Senão como poderíamos explicar que o remorso seja um sentimento que mesmo os incrédulos experimentam? Não gostaria que se instaurasse uma oposição seca entre quem crê em um Deus transcendente e quem não crê em nenhum princípio supra-individual. Gostaria de recordar que era dedicado justamente à ética o grande livro de Spinoza que começa com uma definição de Deus como causa de si mesmo. Salvo que esta divindade spinoziana, bem o sabemos, não é nem transcendente nem pessoal: mesmo assim, também da visão de uma grande e única substância cósmica, na qual um dia seremos reabsorvidos, pode emergir uma visão da tolerância e da benevolência, exatamente porque é no equilíbrio e na harmonia da substância única que estamos todos interessados. E o estamos porque de alguma maneira acreditamos que é impossível que essa substância não tenha sido enriquecida ou deformada por aquilo que, durante milênios, estivemos fazendo. Assim, ousarei dizer (não é uma hipótese metafísica, é apenas uma tímida concessão à esperança que jamais nos abandona) que, mesmo em tal perspectiva, poderíamos recolocar o problema de alguma vida depois da morte. Hoje o universo eletrônico nos sugere que podem existir seqüências de mensagens que se transferem de um suporte físico a outro sem perder suas características inimitáveis, e parecem sobreviver como puro imaterial algoritmo no instante em que, abandonado um suporte, ainda não estão impressas em um outro. E quem sabe se a morte, assim como a implosão, não seja explosão e estampido em algum lugar entre os vórtices do universo, do software (que outros chama de "alma") que elaboramos vivendo, feito também de recordações e remorsos pessoais e, portanto, de sofrimento insanável ou sendo de paz pelo dever cumprido, e amor.
Mas o Senhor diz que, sem o exemplo e a palavra de Cristo, qualquer ética laica careceria de uma justificativa de fundo que tenha uma força de convicção ineludível. Por que retirar do laico o direito de valer-se do exemplo do Cristo que perdoa? Procure, Carlo Maria Martini, para o bem da discussão e do conforto em que acredita, aceitar, mesmo que por um só instante, a hipótese de que Deus não exista: que o homem, por um erro desajeitado do acaso, tenha surgido na Terra entregue a sua condição de mortal e, como se não bastasse, condenado a ter consciência disso e que seja, portanto, imperfeitíssimo entre os animais (e permita-me o tom leopardiano dessa hipótese). Esse homem, para encontrar coragem para esperar a morte, tornou-se forçosamente um animal religioso, aspirando construir narrativas capazes de fornecer-lhe uma explicação e um modelo, uma imagem exemplar. E entre tantas que consegue imaginar - algumas fulgurantes, outras terríveis, outras ainda pateticamente consoladoras - chegando à plenitude dos tempos, tem, num momento determinado, a força religiosa, moral e poética de conceber o modelo do Cristo, do amor universal, do perdão aos inimigos, da vida ofertada em holocausto pela salvação do outro. Se fosse um viajante proveniente de galáxias distantes e visse-me diante de uma espécie que soube propor-se tal modelo, admiraria, subjugado, tanta energia teogônica e julgaria redimida esta espécie miserável e infame, que tantos horrores cometeu, apenas pelo fato de que conseguiu desejar e acreditar que tal seja a verdade. Abandone agora também a hipótese e deixe-a para os outros: mas admita que, se Cristo fosse realmente apenas o sujeito de um conto, o fato de que esse conto tenha sido imaginado e desejado por bípedes implumes que sabem apenas que não sabem, seria tão milagroso (milagrosamente misterioso) quanto o fato de que o filho de um Deus real tenha realmente encarnado. Este mistério natural e terreno não cessaria de perturbar e adoçar o coração de que não crê.
Por isso, considero que, nos pontos fundamentais, uma ética natural - respeitada na profunda religiosidade que a anima - possa ir de encontro a princípios de uma ética baseada na fé na transcendência, a qual não pode deixar de reconhecer que os princípios naturais foram esculpidos em nosso coração com base em um programa de salvação. Se restam, como certamente hão de restar, margens não-superáveis, não ocorre diversamente no encontro entre religiões diversas. E nos conflitos de fé deverão prevalecer a caridade e a prudência.

UMBERTO ECO

domingo, 14 de junho de 2009

As unificações italiana e alemã

Pré PADRÃO / Segundo ano Padrão / Terceiro ano Executivo Colégio e Curso
O nacionalismo e luta pela unificação Nacional: Alemanha e Itália
Com a expansão da Revolução industrial pela Europa a partir dos anos de 1830, as elites dominantes em alguns Estados da Península itálica e da Confederação germânica passaram a lutar em favor da unificação das suas respectivas regiões. Essa etapa seria decisiva na luta desses Estados para equiparar-se à França e à Inglaterra. Politicamente frágeis essas duas burguesias não se sentiram em condições de assumir a direção desse processo e, por isso, se colocaram sob a tutela de projetos monárquicos exigindo, em contrapartida que, após a concretização da unidade nacional, fosse adotado o modelo monárquico-constitucional e que o Estado fomentasse o desenvolvimento da economia nacional.

Nacionalismo: a base teórica dos processos de unificação
Para situarmos historicamente as idéias nacionalistas no século XIX adotaremos a definição explicitada por Burns em História da Civilização Ocidental (Vol.2). Para este autor, o nacionalismo é “(...) um sentimento com raízes em amplas circunstancias históricas, geográficas, lingüísticas e culturais. Ele se caracteriza pela consciência que tem um grupo de pertencer a uma tradição derivada dessas circunstancias, as quais diferem das tradições de outros grupos. A formação nacional é a realização política dos propósitos do nacionalismo, a tradução do sentimento em poder.”. (BURNS, Op.cit. p.573). Este sentimento, durante a primeira metade do século XIX, foi alvo de interpretações dispares: se para burgueses significava a ampliação de mercados nacionais, para grupos populares traduziu, em diversos países, a exemplo da Grécia, o desejo de construção de uma nação independente e democrática.
Não poderíamos deixar de referenciar também que o sentimento e as idéias nacionalistas sofreram profunda influência do romantismo do século XIX. Ambos ligavam-se pela crença de que se devia fazer o passado funcionar como um meio de compreender o presente e planejar o futuro, ou seja, articulavam-se através de uma teoria da História.
Pensadores como Johhann Von Herder (1744-1803), deixaram como legado a idéia de que a construção histórica do mundo civilizado não era produto de uma elite de letrados iluminados e sim da genuína cultura do povo comum, elemento que deveria gozar de autonomia e direito para se expressar livremente. Outro pensador que foi fundamental para a edificação das idéias que acabaram fundindo o romantismo ao nacionalismo no século XIX foi Georg Hegel (1770-1831). Professor da universidade de Berlin, Hegel teve inúmeros seguidores. Sua teoria da História advogava a idéia de que as sociedades evoluem no sentido do progresso sendo o conflito dialético das idéias o motor dessa evolução. As instituições sociais e políticas evoluíam, amadureciam, realizavam seus objetivos e davam lugar a outras. Como o padrão da mudança era dialético, haveria o choque entre o velho e o Novo destinado a produzir uma síntese. “Hegel esperava, por exemplo, que a desunião entre os Estados alemães (tese – ‘o velho’) que gerava a idéia de unificação (antítese – ‘o novo’), tivesse como resultado inevitável a criação de um Estado nacional (síntese).”. (adaptado de BURNS, Op.cit. p.576). Nessa visão, portanto, passado e presente se articulavam em uma síntese de idéias que produziria uma nova sociedade. Em resumo, é na valorização do passado que nacionalismo e romantismo se entrecruzavam para produzir uma visão de mundo que favoreceu a luta pela unidade nacional.
Finalmente, não poderíamos deixar de mencionar as contribuições de Lord Byron, talvez o mais nacionalista dentre todos os românticos: expressando os conflitos fundamentais do seu tempo, tornou-se famoso por representar as emoções e a liberdade de seu eu individual moderno em afirmações como: “ainda que tivesse que ficar só, não trocaria minha liberdade de pensar por um trono”. Esse poeta também engajou-se apaixonadamente em uma causa nacionalista coletiva: a independência da Grécia, pela qual morreu em combate e sobre a qual escreveu:
“Ilhas da Grécia ó da Grécia as ilhas
Lá onde a ardente Safo amou, escreveu,
De onde as artes da guerra e paz são filhas,
E onde delos surgiu, febo nasceu!
O eterno estio as doura sempre ainda.
Mas só o sol resta de uma glória finda.
[...]
Lá do alto as serras fitam Maratona,
E Maratona, os olhos põe na enseada.
Meu pensamento ali flutuando à tona,
Sonhava com uma Grécia libertada.
Se o túmulo dos persas eu pisava,
Havia eu de ser escravo em terra escrava”. (BYRON, GEORGE GORDON. ILHAS DA GRÉCIA).


Processos de unificação: antecdentes.
Inicialmente, nos processos revolucionários de 1830 e 1848, o Nacionalismo foi um sentimento reavivado contra as pretensões restauradoras das forças que emergiram temporariamente vitoriosas do congresso de Viena (1815). Por essa época, a bandeira do nacionalismo foi agitada em conjunto com a do voto universal masculino, por forças populares, o que explica o afastamento burguês desses movimentos e seus fracassos na Alemanha e na Itália.
Separada das tendências revolucionárias após 1850, a chamada política das nacionalidades, agora sob direção burguesa, ganhou um caráter conservador – de unidade de mercado sob direção e monopólio político burguês – iniciando a trajetória que levaria a unificação de nações como a Itália e a Alemanha. A direção desses movimentos de unificação teve como ponto de partida áreas onde a revolução industrial estava em andamento e a procura de mercados consumidores.

A unificação italiana
Napoleão Bonaparte criou diversos Estados na península Itálica: Reino da Etrúria, Reino de Itália (1805-1814) e entregou o governo do Reino de Nápoles ao seu irmão José. Durante esse período, esses territórios passaram por reformas liberais e pela extinção dos privilégios feudais e eclesiásticos.
A Itália napoleônica (1812)
Após o
Congresso de Viena, com a conferência de paz que se seguiu à derrota de Napoleão e a liquidação do sistema, a península Itálica ficou dividida e subjugada. A Áustria dominava a Lombardia e Vêneto (Venécia); os ducados de Parma e Piacenza, Módena e Toscana eram regidos pelos arquiduques austríacos; o Piemonte, que integrava o Reino de Sardenha junto com o Ducado de Sabóia e Gênova, era governado pela casa de Sabóia; o Papa governava os Estados Pontifícios, estendendo sua autoridade às províncias do Adriático, e os Bourbon voltaram ao Reino das Duas Sicílias. Em todas essas regiões, foi estabelecido o absolutismo. O único Estado que permaneceu mais ou menos liberal foi o Reino da Sardenha, na ocasião composto das atuais regiões de Piemonte e da Sardenha.
Península Itálica após o Congresso de Viena (1814-1815).
Os governantes do Antigo Regime, impostos pelo Congresso de Viena, sem apoio popular, governavam com auxílio das forças austríacas. Entretanto, as idéias nacionalistas e revolucionárias continuavam propagando-se, incentivadas pelo progresso econômico e o amadurecimento das instituições. O incremento da produção têxtil do Reino do Piemonte-Sardenha exigia um vasto mercado que somente poderia ser a Itália unificada. As
ferrovias favoreceram as comunicações e, com elas, a unidade dos diversos Estados. Outro elemento aglutinador era a língua italiana. Os italianos podiam estar separados pelas fronteiras, com monarcas estrangeiros impostos pela Santa Aliança, mas ninguém podia despojá-los do idioma de Dante, Petrarca e Boccaccio. Por outro lado, o romantismo, que se identificou na Itália com o Risorgimento letterario, adquiriu um claro poder político. Assuntos aparentemente literários ou históricos encontravam-se cheios de alusões à escravidão e a tirania. Onde não se tolerava a crítica, empregava-se a sátira.
As idéias revolucionárias também se propagaram através de sociedades secretas, como a dos carbonários. Durante o domínio napoleônico, formou-se na Itália uma resistência que contou com membros de uma organização secreta – a
Carbonária. Sendo uma sociedade mais ou menos maçônica, surgiu em Nápoles, dominada pelo general francês Joaquim Murat, cunhado de Bonaparte. Seu objetivo, como o da maçonaria em geral, era combater a intolerância religiosa, o absolutismo e defender os ideais liberais. Lutava contra os franceses porque as tropas de Napoleão haviam iniciado uma espoliação da Itália, embora defendessem os mesmos princípios de Bonaparte.
Com a expulsão dos franceses, os Carbonários queriam unificar a Itália e implantar os ideais liberais. A organização clandestina não tinha nenhuma ligação popular, pois, por razões de segurança não divulgava suas atividades. Além disso, a Itália era uma região
agrícola e extremamente católica, com camponeses analfabetos e religiosos, que tradicionalmente se identificavam com idéias e chefes conservadores. Giuseppe Mazzini (1805-1872), político genovês, entrou para a sociedade dos Carbonários em 1830. Ao ser preso em 1831 por advogar inflamadamente a rebelião, passou a criticar as sociedades secretas, seus ritos e a ineficiência militar. Afinal, elas não conseguiram realizar a unificação italiana e não tinham nenhuma representatividade popular. Da crítica às sociedades, Mazzini passou à ação. Fundou o movimento Jovem Itália, organização paramilitar que pretendia libertar as regiões italianas do domínio austríaco e unificar o país, por meio da educação do povo e da fundação de uma república democrática. Suas palavras de ordem eram: direito dos homens, progresso, igualdade jurídica e fraternidade. A sociedade organizou células revolucionárias em toda a península.
A esse movimento democrático opunham-se outras correntes que também pretendiam a unificação italiana. Eram os reformistas monarquistas, contrários à violência proposta por Mazzini e que acreditavam na realização da unidade política em torno do Reino do Piemonte-Sardenha e sob um regime monárquico constitucional.
Em 1820, revoltam-se em Nápoles dois oficiais franceses, Morelli e Silvati, com as suas divisões de cavalaria, claramente incitados pela agitação que eclodira pouco antes na Espanha (luta pela Monarquia Constitucional). A revolta começa vitoriosa, o exército agrupa-se quase completamente ao redor dos insurretos, cujo comando é assumido por Guglielmo Pepe. O rei vê-se forçado a proclamar a constituição e a formar um governo predominantemente constituído por antigos adeptos de Joaquim Murat. Os acontecimentos em Nápoles se propagam imediatamente à Sicília, onde a revolta assume um caráter autonomista. Um movimento de carbonários piemonteses exige da mesma forma a promulgação de uma constituição, concedida pelo regente do rei Carlos Félix, Carlos Alberto. Mas tanto o movimento napolitano quanto o piemontês são reprimidos. Morelli e Silvati acabam na prisão e com eles muitos outros. No Piemonte, Laneri e Grelli são condenados. E assim quase todos os que tinham se comprometido com as insurreições dos carbonários se vêem forçados a ir para o exílio.
O que caracteriza essas primeiras tentativas é o quase completo afastamento das massas populares e da burguesia. São movimentos conduzidos por oficiais e descendentes da nobreza, com ideais de liberdade, constituição e parlamento, muito distantes das preocupações da população ligada à agricultura principalmente, tais como repartição de terras e contratos de arrendamento. As insurreições seguintes, de
1830 e 1831, sobretudo nos Estados da Igreja, em Módena e em Parma, igualmente reprimidos em sangrentos combates, continuam a não mostrar modificações nesta esfera.
O movimento de unificação de Itália foi desencadeado pela
revolução de 1848-1849. Após a Revolução de Julho, na França, nacionalistas italianos começaram a apoiar Mazzini e o movimento Jovem Itália. Foram incentivados pelo liberal Carlos Alberto da Sardenha, que havia assumido o trono da Sardenha e que se tornara o governante de Piemonte em 1831. O rei Carlos Alberto adotou uma forma de governo diferente dos demais: o parlamentarismo. Seguindo, inclusive, orientações do Papa Pio IX, que abolira o absolutismo nos Estados Pontifícios, dando anistia aos condenados políticos, promulgou uma Constituição liberal (o Estatuto Fundamental). Administrador capaz reformou o sistema financeiro e reforçou o exército.
Em
1847, Camilo Benso, o Conde de Cavour, começou a editar um jornal chamado Il Risorgimento, influenciando largamente o rei, que, convicto da necessidade de expulsar os austríacos da Lombardia e de Veneza, declarou guerra à Áustria em 1848, contando unicamente com suas próprias forças. Os sardo-piemonteses tiveram que lutar sozinhos, sendo derrotados em Custozza (1848) e Novara (1849). As condições de paz eram humilhantes para serem aceitas e, acreditando que sua utilidade para o país havia terminado, Carlos Alberto abdicou em 23 de Março de 1849 em favor de seu filho Vitor Emanuel II (1849-1878) e se exilou em Portugal, vindo a morrer meses depois.
Entre
1848 e 1849, começam as tentativas de unificação do reino da Itália. Durante esse período, os revolucionários proclamam pelo menos três repúblicas, a de São Marcos, a Toscana e a República Romana. Essa última república foi proclamada quando, em 1849, Mazzini comandou uma revolução em Roma. Os revoltosos cercaram o palácio do Quirinal, onde morava o Papa Pio IX, e o ameaçaram seriamente. Para salvar-se, o Pontífice, dissimulado sob outros trajes, fugiu para Gaeta, fortaleza localizada no Reino das Duas Sicílias (24 de novembro de 1848). Em 9 de Fevereiro de 1849, uma Assembléia Constituinte em Roma proclamou a República Romana. Um dos primeiros atos da nova república foi a elaboração de uma constituição que pudesse ser utilizada por uma Itália unida. Pio IX apelou para as potências européias, pois o Congresso de Viena tinha reconhecido e confirmado as fronteiras dos Estados da Igreja. Nações católicas como a Áustria, a França e a Espanha mandaram tropas para atacar Roma e a república foi abolida em Julho de 1849. O Papa voltou à sua capital em 1850.
O movimento de Mazzini, apesar de outras tentativas de insurreição, em
1853, enfraquecia. As forças que queriam construir uma Itália mais moderna e democrática foram vencidas. Depois da onda revolucionária, os partidos mais tradicionais cresceram, promovendo posteriormente a unidade italiana, em bases não-democráticas, sob a égide do Reino da Sardenha. A derrota dos revolucionários provocou a restauração do absolutismo em quase todos os Estados italianos. O único reino que manteve uma constituição liberal foi o Piemonte-Sardenha. Quase todos os partidos empenhados na unificação depositaram aí suas esperanças.

Vitor Emanuel e Cavour
Vitor Emanuel II subiu ao trono do Reino de Sardenha com 29 anos. Destemido na guerra, embora não tão bem dotado como governante, mostrou coragem ao rejeitar as imposições da Áustria para que revogasse a Constituição de seu pai, embora esta atitude tenha lhe custado extensos territórios. Mas ao insistir em conceder anistia aos italianos que haviam se revoltado contra os austríacos, tornou-se um herói para seu povo, atraindo vários partidários de idéias unificadoras. Apesar da derrota de seu pai, seu reino crescia a cada dia em população e progresso, tornando-se o centro do movimento nacionalista.
Após a derrota frente à Áustria, em
1852, Vítor Emanuel II nomeou como Chefe de Gabinete o Conde de Cavour (1810-1861), líder do Partido Moderado e descendente de ricos latifundiários. Este político queria dar à Itália uma Constituição de tipo britânico e era partidário da unificação da Itália, acreditando que a Casa de Sabóia deveria liderar o processo. Um dos principais obstáculos à unidade italiana era a Áustria, que possuía muitos territórios no Norte da Itália. Cavour atuou em duas frentes para derrotá-la: no reaparelhamento militar e econômico do Piemonte-Sardenha e na diplomacia internacional para conquistar aliados contra aquele país.

O Conde de Cavour (1810 - 1861).
Internamente, Cavour procurou desenvolver a
indústria, o comércio, as ferrovias e o exército sardo-piemontês. Externamente, participou da Guerra da Criméia (1854-1856) contra a Rússia, ao lado da França e da Inglaterra, para obter apoio contra a Áustria. Em 1855, Napoleão III, que contrário aos tratados de Viena (1815), apoiar o Piemonte-Sardenha. Em 1856, França e Inglaterra debatiam abertamente o problema do obscurantismo predominante nos Estados Pontifícios e no Reino das Duas Sicílias, chegando à conclusão de que as duas potências tinham a responsabilidade de modificar essa situação. Cavour utiliza-se da Conferência de Paris, após a guerra, para denunciar a Áustria e despertar o interesse das nações européias para a causa italiana.
Ele e Napoleão III se reuniram secretamente em
Plombiers, no verão de 1858. No final do encontro, a França se comprometeu a apoiar o Reino Sardo-Piemontês em caso de invasão austríaca. Confiando nessa promessa, Cavour logo iniciou uma política beligerante contra os austríacos, tentando envolvê-los numa guerra contra o Piemonte-Sardenha.
As Guerras de Independência
Entre
1848 e 1866 os exércitos do Reino de Sardenha e do Império Austríaco combateram três guerras que, com êxitos alternados, levaram à libertação da maior parte do Norte da Península Itálica do domínio austríaco.
A
primeira guerra se desenvolveu em 1848-1849 e terminou com a derrota do exército sardo-piemontês. A segunda guerra se desenvolveu em 1859, quando o Reino de Sardenha se aliou à França e terminou com a derrota da Áustria e a formação do núcleo que originaria o reino de Itália. A terceira guerra ocorreu em 1866 e o Reino de Itália aliou-se à Prússia contra a Áustria. Graças à vitória do exército prussiano contra a Áustria, o reino de Itália adquiriu o controle sobre o Vêneto.

Giuseppe Garibaldi. Partidário do movimento Jovem Itália, teve de deixar o país em 1834, regressando catorze anos depois.
Os austríacos invadiram o
Piemonte, parte do Reino da Sardenha, em 1859, iniciando a Segunda Guerra de Independência Italiana que teve a França lutando ao lado da Sardenha. A partir do Sul, voluntários aderiram à guerra sob a liderança de Giuseppe Garibaldi, um dos próceres do movimento de unificação do país, chamado a intervir para conferir a este conflito um caráter mais popular. Os povos dos ducados de Módena e Parma, governados por duques ligados ao Império Austríaco, expulsaram seus governantes. A Toscânia, seguida por outros Estados, revoltou-se e juntou-se ao Reino da Sardenha.
Na frente de batalha ao norte, os austríacos sofreram retumbantes derrotas frente aos franceses e sardo-piemonteses nas batalhas de
Montebello (20 de maio de 1859), Magenta (4 de julho de 1859) e Solferino (21 de Junho de 1859). Se as hostilidades continuassem, é muito provável que os austríacos tivessem sido expulsos por completo da Península Itálica. Apesar das vitórias, o governante francês, amedrontado pela possibilidade da guerra evoluir para uma revolução, pela violenta campanha dos católicos franceses (protestando contra o ataque aos Estados da Igreja) e pela possibilidade de a Prússia entrar no conflito em apoio ao imperador Francisco José I da Áustria (a Prússia concentrou poderoso exército nas fronteiras com a França), preferiu assinar um armistício em Villafranca. Em 10 de Novembro de 1859, foi firmado o Tratado de Zurique que confirmava o controle da Áustria sobre o Vêneto, cedia a Lombardia à França e estabelecia o retorno ao trono dos soberanos de Toscana, Parma e Módena. Ainda que Napoleão III repassasse, posteriormente, a Lombardia ao Piemonte-Sardenha, as condições do armistício provocaram indignação nos patriotas. Os ducados de Toscana, Parma e Módena não reempossaram seus soberanos. Esses ducados e parte dos Estados Pontifícios (as Marcas e a Úmbria) optaram, mediante plebiscitos populares, pela união com o Piemonte-Sardenha. Napoleão III concordou, desde que a França recebesse o Ducado de Sabóia e Nice. No mesmo ano, foi feito um plebiscito nessas duas regiões, que passaram à França, praticamente por unanimidade. No transcurso da primeira metade de 1860, o Reino da Sardenha transformou-se no Reino de Itália.
Olhando com desconfiança para a política francesa na Itália, uma vez que ela visava aumentar a zona de influência de
Paris, desequilibrando as forças no continente europeu, o governo inglês preferiu apoiar a criação de um Estado unificado na Itália, impedindo que a França assumisse o papel de árbitro na política peninsular.

A conquista da Sicília
Em Abril de
1860, iniciou-se uma insurreição camponesa na Sicília, para onde se dirigiu Garibaldi. Em Maio de 1860, o lendário Giuseppe Garibaldi – líder da Sociedade Nacional, um movimento criado com o apoio do Conde de Cavour e que tinha por finalidade unificar a Itália – partiu de Gênova e desembarcou em Marsala com um exército popular de 1070 homens conhecido como os "mil de Garibaldi" ou os "mil camisas-vermelhas", porque estes voluntários usavam camisas-vermelhas.
Dentro de duas semanas, os revolucionários chegaram à cidade de
Palermo, obtendo a capitulação de um exército regular de 20.000 homens. Em Setembro, Garibaldi entrou em Nápoles, sendo logo seguido pelo exército de Vítor Emanuel II, que havia conquistado os Estados Pontifícios. Garibaldi assumiu o poder em Nápoles, com o apoio incondicional de uma parte considerável da população, com exceção dos camponeses, que não constituíam uma forte oposição aos latifundiários.
Republicano convicto, Garibaldi opunha-se à política da
Casa de Sabóia, pois ela daria ao país o regime monárquico. Apesar disso, Garibaldi voluntariamente reconheceu a autoridade de Vítor Emanuel quando esta foi exigida por Cavour e entregou o Reino das Duas Sicílias ao rei, pois preferia ver uma Itália monárquica unida a uma Itália desunida. Vítor Emanuel foi proclamado, em 17 de março de 1861, rei da Itália, cuja capital passou de Turim para Florença em 1865, já falecido Cavour. Em 1861, a comunidade internacional, com exceção da Áustria, reconheceu o nascimento do novo Estado italiano.
“Na luta pela Unificação da Itália, Giuseppe Garibaldi (1807-1882), representava os setores da população que queriam fazer da península uma República democrática. Líder dos trabalhadores da região sul, comandou a Insurreição popular que expulsou a dinastia dos Bourbon do reino das duas Sicílias em 1860. Concluída a unificação em 1870, foi eleito Deputado, mas sua sede de justiça social o levou a afastar-se da política em 1880.”. (CAPUANO, Ivonne. De sonhos e utopias... Anita e Giuseppe Garibaldi. São Paulo, Melhoramentos, 1999, p.871).

Veneza e Roma
Ainda permaneciam sem solução o
Vêneto (em poder da Áustria) e Roma (em poder do papa). Negociações diplomáticas, realizadas pelo governo italiano com a Áustria e com o Papa fracassaram.
Em
1866, a Prússia entrou em guerra com a Áustria, auxiliada pelo novo Estado italiano. Garibaldi e os seus homens sofreram muitas derrotas, mas as tropas da Prússia ditaram o resultado final deste conflito. Após a assinatura da Paz de Viena em 1868, a Áustria foi coagida a renunciar ao Vêneto e a região foi integrada ao Reino da Itália.
Em
1862, Garibaldi tentara conquistar Roma, mas fora vencido. Em 1867, tentou novamente, porém o imperador francês Napoleão III, pressionado pelos católicos de seu pais, invadiu Roma e recolocou o Papa no trono. Pela importância histórica da cidade, antiga capital do Império Romano e sede da cristandade ocidental, a Itália sem Roma era como um homem sem cabeça. Os partidários da unificação queriam transformá-la na capital do novo reino. Os obstáculos eram o Exército francês, que ocupava a cidade e o papa, que controlava as amplas massas italianas, majoritariamente católicas.
O primeiro obstáculo foi removido com a
Guerra Franco-Prussiana (1870-1871). Devido a essa guerra, as tropas francesas foram retiradas da "Cidade Eterna" para combater os prussianos, e os italianos invadiram a cidade, que foi ocupada pelas tropas de Vítor Emanuel em 20 de setembro de 1870, sendo transformada na capital do reino que se formava. Em 13 de Março de 1871, Vítor Emanuel ofereceu como compensação ao Papa uma indenização e o compromisso de mantê-lo como chefe do Estado do Vaticano, um bairro de Roma onde ficava a sede da Igreja.
O
Papa Pio IX, consciente de sua influência sobre os católicos italianos e desejando conservar o poder da Igreja, recusou as duas ofertas e declarou-se prisioneiro voluntário do Estado italiano. Além disso, proibiu os católicos italianos de votar nas eleições do novo reino.
Essa incômoda questão de disputas entre o Estado e a Igreja, chamada
Questão Romana, só terminou em 1929, quando o ditador fascista Benito Mussolini, necessitando de apoio da Igreja e dos católicos, assinou com o Papa Pio XI o Tratado de Latrão. Por esse tratado, firmou-se um acordo pelo qual se criava o Estado do Vaticano, o Sumo Pontífice recebia indenização monetária pelas perdas territoriais, o ensino religioso era obrigatório nas escolas italianas e se proibia a admissão em cargos públicos dos sacerdotes que abandonassem a batina.

A unificação alemã
Em meados do
século XIX, o espaço territorial germânico era constituído por diferentes reinos, ducados e cidades livres, que apenas tinham em comum a mesma língua (o alemão) e a mesma base cultural. Nele, a hegemonia política era disputada pelas suas duas principais potências: a Áustria dos Habsburgos, que dominava a Dieta (o Parlamento da Confederação Germânica) e a Prússia, governada pelos Hohenzollern. No plano econômico, o território germânico ainda vivia, em linhas gerais, numa estrutura feudal, em plena Idade Contemporânea; a exceção era a Prússia, mais industrializada, com maior poder econômico, que desde 1834 implantara o "Zollverein", uma aliança aduaneira entre os Estados da Liga Alemã.
Desde o início do
século XIX que o desejo da unidade nacional podia ser notado, principalmente nos meios acadêmicos e literários. Como exemplo, Freiherr vom Stein, na Prússia, tentou implantar um programa político inspirado nessa pretensão, porém acabou sendo afastado em 1808. Após isso a Áustria reafirmou sua influência e o nacionalismo alemão ficou inoperante até 1848, quando ocorreram diversas revoluções por toda a Europa, a chamada "Primavera dos Povos".

Revolta de 19 de Março de 1848 em Berlim.
A partir do movimento de Fevereiro de
1848, na França, que conduziu à abdicação de Luís Felipe de Orleans, nos meses seguintes, diversos Estados alemães também se revoltaram, registrando-se manifestações populares e um movimento a favor de um parlamento nacional eleito pelo povo, que elaborasse uma nova constituição para uma Alemanha unificada.
No
Império Austríaco, constituído pela Áustria e pelos reinos da Hungria, da Boêmia, Lombardo-Vêneto e da Galiza (sul da atual Polônia), registravam-se tendências separatistas entre as diversas minorias étnicas, que haviam sido arbitrariamente reunidas sob a Coroa Austríaca pelo Congresso de Viena (1815). Submetidas a um regime político absolutista, personificado pelo primeiro-ministro von Metternich, a Áustria-Hungria era uma região economicamente atrasada, onde no campo persistiam os laços de servidão, e nos centros urbanos, uma alta burguesia pouco numerosa controlava as atividades econômicas, sujeitando a pequena burguesia, os artesãos e os operários.
Em
Março de 1848, assim que as notícias do levante de Fevereiro em Paris tornaram-se conhecidas em Viena, a burguesia liberal uniu-se à pequena burguesia e ao operariado, promovendo manifestações de rua para reivindicar a ampliação do direito de voto e a destituição de Metternich. Diante da radicalização do movimento, Metternich fugiu para a Inglaterra e o imperador Fernando I outorgou uma Constituição, com a qual esperava esvaziar a revolta. Entretanto, um novo levante em Maio obrigou-o a convocar uma Assembléia Nacional, eleita por sufrágio universal masculino.
Poucos dias após a
insurreição em Viena, burgueses e operários de Berlim ergueram barricadas nas ruas, entrando em choque com as tropas do rei Frederico Guilherme IV da Prússia, que também foi obrigado a autorizar a convocação de uma Assembléia Constituinte. Ao mesmo tempo, ainda em Maio de 1848, uma Assembléia composta por deputados eleitos por todo o território germânico - o Deutscher Bund - se reuniu em Frankfurt para a elaboração da nova constituição alemã. Nela, distinguiam-se dois grupos de deputados: os Grossdeutsche e os Kleindeutsche. Os deputados do primeiro grupo defendiam uma Alemanha incluindo a Áustria, estendendo-se do mar Báltico, ao norte, até ao Adriático, ao sul. Já o segundo grupo defendia uma Alemanha sob liderança dos prussianos, excluindo assim a Áustria. A solução encontrada para o impasse foi a de um Estado governado pelos Hohenzollern. A Coroa da nova Alemanha foi oferecida ao rei da Prússia, Frederico Guilherme IV, que recusou-a e também não aceitou a Constituição de Frankfurt. Esta atitude foi repetida pelo governo da Áustria e dos outros Estados alemães. O povo alemão, embora quisesse ver a nova Constituição aprovada, não estava totalmente satisfeito com ela, pois o poder ainda continuaria na mão dos antigos líderes. Deste modo, a revolução ficou enfraquecida, a Assembléia foi dissolvida e a restauração conservadora se completou, acabando, por algum tempo, com o sonho de uma Alemanha unificada. Em Viena, constatando que não conseguia mais controlar o povo, a burguesia voltou atrás em seu apoio à revolução, optando por sujeitar-se a um governo fortemente centralizado a colocar em risco a sua posição econômica. Com a união da burguesia à aristocracia, o exército retomou a cidade, conseguindo sufocar a rebelião em Outubro. O novo primeiro-ministro, Schwarzenberg, dissolveu a Assembléia Constituinte, forçando o imperador Fernando I a abdicar em favor de seu sobrinho Francisco José, que restaurou o Absolutismo. Nas demais regiões do Império, as minorias nacionais, encorajadas pelos levantes de Viena e Berlim, mobilizaram-se pela independência. Na Boêmia (atual República Checa), em Abril de 1848, foi convocado um Parlamento independente como primeiro passo para a formação de uma Assembléia Constituinte. Na Hungria, o advogado Lajos Kossuth, líder do movimento autonomista, proclamou a República, em Abril de 1849. Mas todas essas rebeliões foram sufocadas pelo exército austríaco que, no caso da Hungria, recorreu à ajuda das tropas do czar Nicolau I da Rússia.
As
Revoluções de 1848 na região, mesmo sem sucesso, permitiram mostrar o caminho a ser seguido: um processo de unificação liderado pela Prússia, mas não pelos meios revolucionários, e sim pela Casa dos Hohenzollern.

Otto von Bismarck o "Chanceler de Ferro" (1815-1898), responsável pela unificação do território alemão.
O fracasso da
Revolução de 1848, de intuitos unificadores, implicou a continuidade da fragmentação da Alemanha. Na década de 1850, os grandes senhores da Prússia, detentores do poder político, mantinham os seus privilégios - o monarca, receando uma nova revolução, resolveu manter a Constituição onde esses privilégios eram consagrados.
A partir de
1848, o ritmo de desenvolvimento do setor industrial e das cidades foi bastante acelerado e apenas a divisão política travava o progresso do capitalismo. Tornava-se indispensável a unificação da Alemanha para prosseguir o projeto econômico germânico.
A liderança da unificação alemã ficou com a
Prússia, pois este era o Estado alemão mais industrializado e com grande importância política na Europa. Era também a maior potência militar entre os estados alemães. Seu desejo expansionista vinha de algumas décadas, de quando desejava unificar seus territórios ocidental e oriental. Para este fim havia nascido o Zollverein (1834). A criação do Zollverein proporcionou à região um grande crescimento industrial e integração dos Estados, principalmente com o desenvolvimento de uma rede ferroviária interligando as diversas regiões do território germânico;

Bismarck, Roon e Moltke.
Por volta de
1850, a Prússia já superava economicamente a Áustria, mas a liderança política veio apenas em 1862, quando começou a governar a Prússia o rei Guilherme I, um apaixonado pelas questões militares, que fez uma reforma em suas forças armadas. Convocou, para auxiliá-lo, Moltke, chefe de Estado-Maior, e Roon, como ministro da Guerra. O exército da Prússia logo se transformou no melhor da Europa.
Otto von Bismarck - que tinha ocupado, entre outros cargos, o de embaixador na Rússia e na França - foi nomeado chanceler (primeiro-ministro). Membro da aristocracia alemã e também favorável a uma monarquia centralizada, Bismarck realizou uma política de aliança dos junkers (grandes proprietários e aristocratas) com a alta burguesia, e através dela resolveu fortalecer o Zollverein, intensificando a integração dos Estados alemães além de modernizar o Exército, sendo isso de grande importância para as batalhas que aconteceriam nos anos seguintes. Utilizando-se da estratégia de exaltação do espírito nacionalista, criou uma política de guerras contra inimigos externos e contra a ocupação das regiões alemãs, o que auxiliou na expansão do território prussiano e, posteriormente, germânico. Em um período de sete anos (1864 - 1871), três guerras de destaque foram decisivas para a unificação dos Estados germânicos: A Guerra dos Ducados (1864), a Guerra Austro-Prussiana (1866) e a Guerra Franco-Prussiana (1870-1871).

A Guerra dos Ducados (1864), contra a Dinamarca
Em
1864 a Prússia juntou-se a Áustria em uma guerra contra a Dinamarca pelo domínio dos ducados de Schleswig e Holstein. O confronto ficou conhecido como Guerra dos Ducados' e ao seu final, Prússia e Áustria, vitoriosas, dividiram a administração dos ducados através da Convenção de Gastein, em 1865. A Áustria, porém, tentou implantar uma política única ao condado de Holstein, privando assim a Prússia de direitos assegurados em outros acordos. Restou a Bismarck entrar em guerra contra a Áustria em 1866.

A Guerra Austro-Prussiana (1866)
Em
1866, a Prússia, com o auxilio da Itália, também sob processo de unificação nacional, entrou em Guerra contra a Áustria. A vitória prussiana veio após a Batalha de Königgrätz, em Sadowa (03 de Julho de 1866). No dia 23 de Agosto de 1866 foi firmado o acordo de paz em Praga. Com a vitória a Prússia expulsou a Áustria da Alemanha. No ano seguinte, Bismarck dividiu a Confederação em dois grupos de Estados; a Confederação do Norte e a do Sul, tendo como limite o rio Main. A Confederação da Alemanha do Norte, logicamente, ficou sob seu controle, com os países (principados e cidades livres), luteranos, que a apoiaram na Guerra Austro-Prussiana. Os quatro Estados que formavam a Confederação do Sul, majoritariamente católicos, não conseguiram se consolidar em uma unidade. Estes Estados viriam a negociar um pacto com a Confederação da Alemanha do Norte, segundo o qual, em caso de guerra com a França, o rei da Prússia tornar-se-ia general dos exércitos germânicos. A Confederação do Norte é a antecessora do posterior Império Alemão, que precisava de muito pouco para se concretizar: a guerra contra a França.

A Guerra Franco-Prussiana (1870-1871)

Napoleão III e Bismarck após a Batalha de Sedan.
Apesar de a
Áustria ter sido derrotada pela Prússia, o sul da Alemanha era constituído por democratas e aspiravam uma Alemanha liberal, se opondo à união com a Prússia de Bismarck, que era um Estado militarista. Visando eliminar este entrave à unificação do norte com o sul, Bismarck necessitava de um inimigo comum que uniria, e possibilitaria a futura unificação; e este inimigo mais adiante seria a França de Napoleão III. Desde os tempos das guerras napoleônicas (de Napoleão I, derrotado em 18 de junho de 1815), os prussianos não simpatizavam com a França, e os professores prussianos repassavam este sentimento aos seus alunos em relação à nação francesa. Daí, Bismarck afirmar que foi o mestre-escola quem ganhou a guerra franco-prussiana, logo após a derrota da França na guerra contra a Prússia.

Pretexto da Guerra Franco-Prussiana (1870-1871)
A
Espanha, que estava sem rei desde 1868, ofereceu através de seu parlamento a Coroa ao príncipe Leopoldo de Hohenzollern-Sigmaringen, parente afastado do rei da Prússia (também da Casa dos Hohenzollern). Tal fato era inaceitável pela Europa anti-prussiana que contava também com a França. O ministro do exército francês proferiu um discurso indignado e belicoso contra a Prússia, o que gerou sentimentos anti-franceses no sul da Alemanha. Bismarck aproveitou-se da idéia de guerra entre os dois países, pois estava interessado em territórios franceses e sabia que conseguiria apoio no sul da Alemanha, o que seria decisivo para seus planos de unificação alemã. Ele também sabia da superioridade de seu poderio militar sobre o medíocre exército francês. Todavia antes do conflito começar, Napoleão III temendo a expansão prussiana, protesta e exige do rei da Prússia a renúncia do príncipe Leopoldo, que desiste de disputar o trono espanhol. Napoleão III ainda não satisfeito, e querendo agradar à opinião pública francesa, exige novas garantias de que jamais um membro de sua família ocuparia o trono espanhol.
Apesar de Guilherme I aceitar todas as condições impostas pelo imperador francês, este último insistia que o rei deveria dar estas garantias e negociar pessoalmente ao embaixador Benedetti da França. O rei prussiano que anteriormente atendera a todas as reivindicações de
Napoleão III refutou (recusou) ter que negociar e dar novas garantias ao embaixador francês, Benedetti.
Em
Paris, a atitude do rei prussiano foi tida como uma ofensa ao orgulho nacional da França e ao povo francês - este foi o motivo da França de Napoleão III declarar guerra à Prússia.
Finalmente
França e Prússia entraram em guerra em 1870 e, logo a Prússia mostrou-se preparada o suficiente para encurralar a França em seu próprio território. Os franceses perderam em todas as frentes. O forte exército prussiano acumulava vitórias, como sucedeu na esmagadora vitória na batalha de Sedan (01 de Setembro de 1870) na qual o próprio imperador francês foi feito prisioneiro. No dia 20 desse mês, os prussianos cercavam Paris. Perante esta situação, o governo de Defesa Nacional (republicano, em funções desde 04 de Setembro, altura em que depusera Napoleão III) assinou a rendição. Na paz de Frankfurt (10 de Maio de 1871) a França, para além de pagar uma pesada indenização de 5 bilhões de francos para a Prússia, entregava o rico território da Alsácia-Lorena, de maioria germânica e rica em carvão, para o novo Império Alemão.
A vitória em
Sedan estimulou o nacionalismo no sul da Alemanha e os Estados germânicos ao sul do rio Main (Hesse, Baden, Baviera e Würtemberg) entraram na Confederação. A esses Estados, porém, foram garantidas certas autonomias, como, por exemplo, exército próprio em tempo de paz.
Com a integração desses Estados ao novo Reich (II Reich; pois o I Reich ou Sacro Império Romano-Germânico foi fundado por
Carlos Magno, rei franco, sucedido mais adiante por Oto I o Grande), completou-se a última etapa para a unificação alemã.

O progresso da Unidade alemã

Consequências da Unificação Alemã
A unificação dos Estados germânicos foi um evento que gerou inúmeras consequências, imediatas ou posteriores, em toda a
Europa e que foram responsáveis pela instabilidade no território europeu até a metade do século XX. É possível dizer que a unificação alemã foi um dos principais motivos para a eclosão da Primeira Guerra Mundial. A unificação da região de Alsácia-Lorena ao Segundo Reich Alemão gerou o revanchismo francês. Os franceses inconformados com a situação e com a humilhação provocada pelos alemães (como na coroação de Guilherme I no próprio Palácio de Versalhes, em território francês) mantiveram um sentimento de revanche que foi decisivo na política de alianças dos países europeus até quando eclodiu o conflito em 1914. Outro fator de influência para o surgimento do conflito foi a batalha dos países europeus por territórios na África e Ásia, no período conhecido como neocolonialismo. Os alemães, recém unificados, exigiam uma redivisão colonial nos continentes, o que aumentou a tensão entre as potências.

Modernização conservadora
As políticas domésticas de Bismarck foram de grande importância para a formação da cultura política autoritária do Império. O governo semi-parlamentar da Alemanha levou a efeito uma suave revolução econômica e política, de cima para baixo, que levaria o país a tornar-se a maior potência industrial do mundo à época.
Os industriais alemães começaram a ganhar fatias do mercado alemão, em detrimento dos exportadores britânicos e, por volta dos anos 1870, estes já percebiam a crescente competição da Alemanha e dos EUA nos principais segmentos nascidos da
Revolução Industrial.
Os objetivos políticos de Bismarck após a unificação podem ser resumidos da seguinte maneira:
·
Kulturkampf: após a incorporação dos estados católicos do sul e as terras anteriormente polonesas ao leste, o catolicismo, representado pelo Partido do Centro Católico, parecia ser a principal ameaça ao nacionalismo militar-aristocrático prussiano de Bismarck, pois os católicos eram vistos como devendo fidelidade ao papa, mesmo acima do Estado alemão. Os católicos do sul, provenientes de uma base agrária e das fileiras dos campesinos, artesãos, clérigos e da aristocracia dos estados menores, diferentemente dos protestantes ao norte, de início tiveram problemas para competir com eficiência frente à abertura comercial. Após 1878, a luta contra o socialismo uniria Bismarck e o Partido do Centro Católico, encerrando a Kulturkampf, que terminara por fortalecer o catolicismo na Alemanha.
· Reforma social: para conter a classe trabalhadora e enfraquecer a influência dos grupos socialistas, Bismarck concordou de maneira relutante em criar um Estado de
Previdência Social que faria os trabalhadores apoiar o nacionalismo alemão. A previdência social instituída por Bismarck era a mais avançada da época e perdura na Alemanha de hoje.
· Unificação nacional: Bismarck procurou reduzir as enormes diferenças entre os estados alemães, que haviam sido independentes por séculos, especialmente na área da legislação.
As histórias do
direito e sistemas judiciais completamente diferentes representavam um enorme obstáculo para a unidade nacional, especialmente na área do comércio. Embora um código comercial comum já houvesse sido promulgado pela Liga Alemã em 1861 (adaptado para o Império e ainda em vigor na Alemanha de hoje, com grandes modificações), em outras áreas do direito as leis eram muito diferentes.
Em 1871, promulgou-se um Código Criminal comum (Reichsstrafgesetzbuch); em
1877, leis de processo civil e criminal. Em 1873, a constituição foi emendada de modo a permitir a promulgação de um Código Civil comum que substituiria todas as leis civis em vigor nos estados. O Código Civil alemão (Bürgerliches Gesetzbuch ou BGB) entrou em vigor em 1º de janeiro de 1900, resultado de um imenso esforço de codificação que criou uma das obras legais mais impressionantes do mundo, ainda em vigor (com modificações).
Os efeitos da modernização conservadora são distintos, devido ao fato de haver procurado atender a anseios freqüentemente expressados por meio de revoluções sociais. Com o poder político permaneceu nas mãos da aristocracia, o governo procurou conservar as estruturas sociais tradicionais, tanto quanto possível, embora a base econômica dos proprietários de terras se reduzisse rapidamente frente à da
indústria. À unificação seguiu-se um longo período de governo conservador e mesmo autoritário.

Militarismo
Um dos subprodutos da modernização conservadora foi o
militarismo. Este foi utilizado para unir as classes dirigentes - tanto a aristocracia-militar como os industriais - em torno do projeto de continuar a modernização sem alterar as estruturas sócio-políticas. Cada estamento da elite encontrava vantagens na expansão ultramarina formal: os gigantescos monopólios queriam o apoio imperial para obter investimentos ultramarinos e afastar a concorrência estrangeira; os burocratas desejavam novas ocupações; os militares queriam ser promovidos; e a aristocracia tradicional, embora em declínio, desejava mais títulos formais.
Ao observar o surgimento do
sindicalismo, do socialismo e de outros movimentos de protesto no início da era da sociedade de massa na Europa e na América do Norte, a elite logrou empregar o imperialismo nacionalista para cooptar o apoio da classe trabalhadora industrial. O imperialismo propagava entre as massas virtudes neo-aristocráticas e instilava sentimentos nacionalistas. Com isto, a Prússia conseguiu criar uma máquina militar suficientemente poderosa para desafiar os rivais no continente europeu e mesmo para se fazer notar na arena internacional.
Os
advogados do imperialismo alemão argumentavam que o poder (inclusive militar) britânico conferia vantagens indevidas ao Reino Unido nos mercados internacionais, em detrimento da Alemanha. Ganhava evidência, também, o papel das colônias como mercado e fonte de matérias primas para as potências emergentes européias (como a Alemanha e a Itália). Esta associação entre tendências econômicas, de um lado, e o neocolonialismo e o militarismo, de outro, levou Bismarck, outrora relutante em envolver o seu país em aventuras ultramarinas, a reconhecer o valor político do colonialismo. As potências centrais absolutistas, lideradas por uma Alemanha que se industrializava rapidamente e cuja marinha havia dobrado de tamanho entre a Guerra franco-prussiana e a Primeira Guerra, representavam uma ameaça estratégica aos mercados e à segurança das potências aliadas e da Rússia. Os esforços coloniais da Alemanha a partir de 1884 renderam-lhe apenas um pequeno império ultramarino, comparado com os do Reino Unido e da França.
As iniciativas posteriores no campo da política externa (particularmente os planos para a construção de uma grande frota de guerra) levaram o Reino Unido a alinhar-se politicamente (a
Tríplice Entente) com uma aliança franco-russa que já se constituía no momento da queda de Bismarck.
O Império floresceu sob a condução de Bismarck até a morte do Kaiser, em março de
1888. Naquele ano, chamado Dreikaiserjahr ("Ano dos Três Imperadores"), Frederico III, filho e sucessor de Guilherme I, sobreviveu ao pai por apenas 99 dias, deixando a coroa ao jovem e arrojado Guilherme II, que forçou Bismarck a renunciar em março de 1890.